Na dor, mãe encontra forças para lutar contra a impunidade

Imagem: "Meu anjo". Era assim que Lilian chamava o filho Breno por conta do temperamento calmo.
"Meu anjo". Era assim que Lilian chamava o filho Breno por conta do temperamento calmo.
24/05/2013 - 18:38 Por: Nathália Barros    Foto: Arquivo

Num sobrado amarelo no bairro Jardim dos Estados, o silêncio absoluto de um quarto alimenta a dor dos moradores. “Ele sempre foi muito tranquilo, então não costumava fazer muito barulho. Mas nenhum ruido...É demais pra mim”. O desabafo é da psicóloga do Centro de Saúde da Casa de Leis, Lilian Silvestrini. Este foi o primeiro ano em que teve que passar o dia das mães sem um dos três filhos.

Não que ele tenha se ausentado para curtir boas viagens, conhecer novas culturas ou coisa parecida. Breno Luigi Silvestrini, filho de Lilian, e o amigo Leonardo Fernandes foram brutalmente assassinados no dia 30 de agosto do ano passado. “Meu filho e o amigo estavam entrando no carro quando foram surpreendidos pela quadrilha. Mesmo em posse do veículo, que seria trocado na Bolívia por três quilos de cocaína, eles quiseram 'entrar no mundo do crime com moral'. Não sou eu quem está dizendo isso, eles mesmos disseram. Para isso, resolveram matar os meninos”, revela.

“O pior dia foi quando cheguei em casa, um dia depois de sermos informados sobre a morte dos garotos, e ao invés de cinco só havia quadro pratos na mesa. Naquele momento tive a certeza de que não poderia mais abraçá-lo, sentir o cheirinho dele. É como se tivessem me dilacerado”, desabafa.

Lilian lembra que foi pega de surpresa com a gestação de Breno. Ana Jéssica (filha do meio) tinha 4 meses de vida quando a psicóloga descobriu que estava grávida de novo. “Acredito que ele veio por desejo de Deus. Na época eu amamentava, tinha todas as condições para não engravidar novamente”, recorda Lilian, que dedicava grande parte da sua energia aos cuidados de Ana, já que a filha convivia com uma série de problemas de saúde.

“Eu o chamava de meu anjo, afinal, sempre foi muito calmo, o que contribuiu para que eu me empenhasse nos cuidados com Ana Jéssica. Com o passar dos anos ele se tornou o ponto de equilíbrio para nós. Sempre muito calmo, tinha a habilidade de apaziguar qualquer conflito”, lembra Lilian.

Com a morte do filho, Lilian passou meses desnorteada. “Os criminosos foram muito cruéis. Primeiro bateram muito nos meninos. Colocaram os dois de joelhos e atiraram. Mesmo com eles já mortos, os bandidos continuaram batendo. Esse é o tipo de coisa que todos temem. Aliás, é algo que ninguém imagina que vai acontecer com alguém próximo, mas acontece”, ressalta Lilian, que decidiu manter a memória do filho sempre viva e ir à luta com o intuito de evitar que outras famílias vivenciem a mesma experiência.

Ação – Desencadeada pela deputada federal Keiko Ota (PSB-SP), a campanha nacional “Pelo Fim da Impunidade” chegou pelas mãos de Lilian e da mãe de Leonardo Fernandes, Ângela Fernandes, em Mato Grosso do Sul. Com o objetivo de fomentar a adoção de penas mais rígidas para os crimes contra a vida, o projeto consiste na busca por assinaturas para que o pleito chegue às mãos dos parlamentares e modifique o Código Penal, criado em 1940, considerado obsoleto. “Quando o abaixo assinado chegou até nós, contava com 2,3 mil assinaturas. Hoje já são mais de 100 mil, o necessário para ser entregue aos deputados e senadores”, esclareceu.

Quando atingiram a meta, Lilian e as amigas ficaram incomodadas com a ideia de a “luta morrer”. “Não poderia deixar que meu filho se tornasse mais um número, engrossasse as estatísticas”, disse. Foi quando nasceu o projeto “Mães da Fronteira”, que pretende mostrar para as autoridades públicas a necessidade de um maior controle na região de fronteira entre Brasil, Bolívia e Paraguai.

“Carrego comigo uma frase que Breno sempre dizia: 'desistir é para os fracos'. Nós não vamos desistir, não somos fracas, nós temos o mesmo ideal e vamos lutar unidas”, defende Lilian, que aproveitou para chamar a população a participar da campanha.

Tantas batalhas já começaram a dar frutos. Em homenagem à luta travada pelo grupo, uma praça localizada no bairro Carandá Bosque, na Capital, passou a chamar “Bosque da Paz Breno e Leonardo”.

“Infelizmente não terei meu filho de volta. Mas tenho certeza de que com essas ações, conseguiremos evitar que muitas mães percam seus filhos”, deseja Lilian.

* No mês em que é comemorado o Dia das Mães, o portal de notícias da Assembleia Legislativa presta homenagens a todas as mães do Estado por meio de histórias como a de Lilian, que mostram a força da palavra “Mãe”.
Permitida a reprodução do texto, desde que contenha a assinatura Agência ALEMS.
Crédito obrigatório para as fotografias, no formato Nome do fotógrafo/ALEMS.