Autoridades e entidades defendem futuro sustentável com agroecologia

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Para participantes, práticas sustentáveis no campo são vitais
26/11/2015 - 18:27 Por: Fabiana Silvestre    Foto: Wagner Guimarães

Produzir cuidando da terra, dos mananciais e de todo o ecossistema, pensando no planeta a ser deixado para nossos filhos, e os filhos deles, que igualmente precisarão plantar e se alimentar. Este foi o tema central da audiência pública A Agroecologia e a Participação das ATERs no Processo, realizada pelo deputado estadual João Grandão (PT) e entidades parceiras, na tarde desta quinta-feira (26/11), na Assembleia Legislativa.

Autoridades e representantes de entidades ligadas à agricultura, especialmente a familiar, participaram dos debates e enfatizaram a importância da agroecologia como sinônimo de saúde, vida e respeito ao meio ambiente. “A agroecologia é uma ciência, um movimento social e também representa práticas com dimensões tecnológicas, políticas e econômicas”, afirmou o deputado João Grandão, que é vice-presidente da Comissão de Agricultura, Pecuária, e Políticas Rural, Agrária e Pesqueira e autor do Projeto de Lei 132/2015, em tramitação na Casa de Leis, que cria o Programa Estadual de Certificação de Alimentos Artesanais da Agricultura Familiar.

Segundo o parlamentar, a agroecologia vai além da não utilização de agrotóxicos, já que realiza o manejo sustentável, valoriza a produção local, inclusive de sementes, e cultiva alimentos em harmonia com a natureza, desacelerando o aquecimento global, ao emitir menos gases do efeito estufa, e com redução considerável dos impactos ambientais causados pela mecanização dos cultivos. João Grandão considera fundamental todo empenho na transição do modelo de agricultura tradicional para uma atuação alternativa e sustentável, que garanta a chamada segurança alimentar, a quem precisa, e que restaure danos causados pela produção industrial. “Até mesmo dados da ONU [Organização das Nações Unidas] revelam que a agricultura deve ser orientada para os modos de produção que sejam mais ambientalmente sustentáveis e socialmente justos, com alimentos até mesmo mais saborosos”, afirmou João Grandão.

O secretário de Estado de Produção e Agricultura Familiar (SEPAF), Fernando Lamas, disse que a agroecologia é um método de produção importante e que pode representar a viabilidade de muitas propriedades em Mato Grosso do Sul. “Temos ambiente extremamente favorável no Estado e, portanto, a iniciativa desta audiência é extremamente oportuna e relevante. Aqui se inicia um novo momento e uma outra perspectiva para a agricultura familiar”, disse. De acordo com o engenheiro agrônomo da Delegacia Federal do Ministério do Desenvolvimento Agrário (DFDA), Marco Antônio de Oliveira Georges, a agroecologia é um tema prioritário para o Governo Federal, mas também requer mudança de comportamento e atitudes. “É perfeitamente viável a produção de alimentos saudáveis através da agroecologia, mas a sociedade como um todo deve abraçar a ideia”, disse.

Outro ponto positivo da produção agroecológica mencionado pelos participantes foi a descentralização da produção, com práticas agrícolas em pequena escala e em várias regiões, o que torna as culturas mais democráticas e menos suscetíveis às intempéries climáticas. A diversidade e fomento ao setor podem contribuir ainda para a fixação dos jovens no campo. Foi defendida a elaboração de um Plano Estadual de Desenvolvimento da Agroecologia, em conformidade com a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER), e a criação de políticas públicas dedicadas à sustentabilidade, com mais investimentos por parte do Poder Público.

Milton Parron Padovan, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em Dourados, falou da 1ª Oficina de Concertação em Agroecologia de Mato Grosso do Sul, realizada no município. Ao todo, 72 participantes, de 36 entidades, compartilharam experiências. “São poucos os princípios inclusivos dos jovens no meio rural. Precisamos fortalecer as escolas do campo, formando professores, e o intercâmbio de conhecimentos entre as entidades, com políticas públicas permanentes”.

Natureza inteligente

Olácio Komori, da Associação de Produtores Orgânicos de MS (APOMS), lembrou que a agroecologia é um movimento de transformação social, chamada por ele de “ciência da vida”. “A agroecologia tem as respostas sobre a metodologia de como produzir mais e melhor em harmonia com o meio ambiente e a natureza. O nosso maior professor é a natureza, que é bastante sábia”, disse. Para Komori, o homem toma decisões que afetam o equilíbrio da natureza e toda a sociedade precisa se envolver para reverter esse quadro. “Vamos aprendendo a entender e interpretar os sinais e ensinamentos da natureza”, analisou.

O produtor explicou que as práticas cotidianas devem ser repensadas, como a utilização excessiva de embalagens. “Temos uma embalagem de bala e uma casca de banana, por exemplo, e qual retorna ao ciclo produtivo da natureza?”. Afirmou que os alimentos têm “embalagens” naturais – as cascas – que mudam de cor e aroma e revelam até quando é próprio o consumo. Ele também defendeu mais profissionalização no setor, com incentivo a quem trabalha agroecologia, pois são essas pessoas que orientam os agricultores no dia a dia da produção.

Compartilhando a própria experiência, o indígena Anastácio Peralta falou dos aspectos culturais e espirituais ligados à alimentação. Para ele, ao adotar a “pedagogia da natureza” os povos indígenas são mais bem nutridos do que os demais. “Os não índios passam trator, veneno, para depois plantar, mas nós não, para nós a semente tem alma e plantamos com reza e benzimento, e isso traz o bem viver e o ser feliz”, disse. Ele defendeu a qualificação da produção e afirmou que é possível sair da roça, estudar e voltar ao campo, contribuindo para o desenvolvimento sustentável.

Encaminhamentos

Representando a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Fernanda Almeida, que também é membro do Fórum de Agroecologia de Mato Grosso do Sul, entregou ao deputado João Grandão proposta para o Plano Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica. O objetivo é garantir a implantação e o fortalecimento da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica. Estão entre as diretrizes previstas: promoção da soberania e da segurança alimentar e nutricional e do direito humano à alimentação adequada e saudável; promoção do uso sustentável dos recursos naturais; da conservação e recomposição dos ecossistemas naturais; e ampliação da participação da juventude rural na produção orgânica e de base agroecológica.

Também foi elaborada a Carta de Mato Grosso do Sul, que alerta para a degradação do meio ambiente causada por atividades ligadas ao agronegócio e o esvaziamento do campo. Defende a agroecologia como mecanismo de justiça ambiental, social e econômica. Já foram concretizados o Fórum de Agroecologia de MS e o Núcleo de Pesquisa e Extensão em Agroecologia, que reúne 42 entidades. Elas requerem um modelo de desenvolvimento que privilegie a vida, com a execução de políticas públicas que garantam a transição do atual modelo agrícola para o que seja orientado pelos princípios agroecológicos.

Na carta também é criticado o que é chamado de “desmantelamento da extensão rural pública” mediante cortes orçamentários e diminuição do quadro de trabalhadores, situação verificada em todo o Brasil. “Defendemos que todas as chamadas públicas de ATER [Assistência Técnica e Extensão Rural] sejam elaboradas a partir da perspectiva agroecológica, valorizando as sabedorias camponesas, povos e comunidades tradicionais”.

Participaram da audiência pública representantes da Embrapa, Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural (Agraer), Fiocruz, Comitê MS contra os Agrotóxicos, associações de produtores orgânicos e de produtores familiares, universidades, entre 20 instituições, além de acadêmicos. 

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