Kemp exige respeito à memória do historiador e indigenista Antonio Brand
“Tenho um respeito ao professor Brand que entregou a sua vida inteira pela causa indígena. Eu o reverencio pelo trabalho e dedicação”.
Em mais um “round” de oitivas a CPI contra o CIMI (Conselho Indigenista Missionário), instalada na Assembleia Legislativa, para apurar a suspeita de que uma das principais entidades solidárias às causas indígenas esteja por trás das retomadas das terras em MS, o clima esquentou. O deputado estadual Pedro Kemp (PT), membro da CPI e conhecidamente apoiador da luta pela demarcação com indenização aos produtores rurais que tenham terras de boa fé, passou cerca de cinco horas acompanhando a explanação do trabalhador rural, José Raul das Neves, dono de 400 hectares da fazenda Do Inho, em Rio Brilhante, vizinha da propriedade ocupada pelos guarani-kaiwoá – que reivindicam terras tradicionais – a Fazenda Santo Antonio.
Porém, durante as perguntas feitas pelos membros da CPI, que criticaram a ausência do procurador Marco Antonio Delfino (MPF), convidado para depor, mas que não pôde comparecer, foram feitas ironias sobre o trabalho de um dos mais respeitados pesquisadores indigenistas do País, o professor Antonio Brand (in memorian) como se o fato de ele ser historiador não tivesse méritos para estudar e auxiliar no mapa que mostra toda a nação guarani que atinge o Brasil, Paraguai, Argentina e Uruguai e serve de parâmetro para os estudos acadêmicos. Essa foi a gota d´água para Kemp.
“O mapa que vocês viram aí da nação guarani é simplesmente resultado de trabalho de pesquisa de várias instituições que produzem conhecimento. Não existe aquela paranóia de que os índios querem demarcar toda essa grande área minha gente! Parece que querem instaurar um estado islâmico. Da onde tiraram isso?”. Com a manifestação de ironia dos parlamentares membros da CPI que estiveram na oitiva de hoje (16), Kemp disparou:
“Vocês podem rir! Vocês falam aqui um monte de besteira e eu não posso me expressar?”. “Tenho um respeito ao professor Brand que entregou a sua vida inteira pela causa indígena. Eu o reverencio pelo trabalho e dedicação”.
A todo tempo Kemp explicou ao dono da fazenda Do Inho que o depoimento dele foi muito franco e que o sentimento do deputado de injustiça foi pontuado diante das falas dos deputados sobre Brand, o procurador Marco Antonio, o indigenista Egon Heck e também da antropóloga Kátia Vinhedo.
“O senhor (Raul) foi muito prudente em sua fala. O senhor deixou claro que houve uma briga na aldeia e uma parte dos índios liderados pelo cacique Farid foi para a área onde o senhor mora e que o senhor não tem provas de que o CIMI está nisso”, pontuou. O ruralista frisou várias vezes que se sente prejudicado pelo MPF e FUNAI, órgãos que defendem os interesses indígenas. Disse que já foi acusado injustamente de deixar uma criança de 9 meses morrer por não permitir a entrada de ambulância na fazenda e também pela morte por atropelamento de um jovem adolescente. Diante de sua inocência, conseguiu reunir provas, segundo ele. Sobre o CIMI, ele suspeita que a entidade missionária apoie as retomadas.
Tenso – Diante do clima tenso entre os membros da CPI do CIMI, Kemp mais uma vez explicou ponto a ponto do que ele chama de condenação prévia e sem isenção do Conselho Indigenista Missionário feita pela Comissão Parlamentar.
“Antes dos colonizadores, eles (índios) já estavam aqui e têm uma ligação de sangue com todos que vivem nessas áreas (Brasil, Paraguai, Argentina, Paraguai e Uruguai). Nós não precisamos ficar medo. O mapa foi amplamente divulgado, está na internet para fonte de pesquisas históricas e antropológicas. A gente tem que tomar muito cuidado com o que fala. Nós temos uma Constituição que diz que as terras têm que ser demarcadas (prazo da lei 5 anos após a promulgação da Constituição – o que não foi feito pelo governo brasileiro). Se houvesse isso, não haveria conflitos. Isso só se resolve com processo de negociação para indenização dos produtores e demarcação. (…) Sobre a antropóloga Kátia, ela foi contratada pela Funai de Brasília. É uma profissional que cometeu o crime de ser contratada para um trabalho. O Egon Heck (fonte tradicional nas reportagens locais, nacionais e internacionais), missionário do CIMI, indigenista que junto com Brand deu a sua vida e sempre fez aquilo que acreditou, um apoiador da causa indígena. Hoje, ele está doente. Registro todo meu respeito ao Egon Heck. Ele nem mora mais aqui sabe por que? Porque foi ameaçado de morte!”.
A fala do Kemp foi finalizada pela presidência da CPI logo após ele fazer a defesa do procurador Marco Delfino e cobrar a elucidação dos assassinatos dos indígenas na Comissão Parlamentar instalada para cobrar do Estado a solução para as mortes, doze que ao longo de dez anos teriam ocorrido por pistolagem.
“O procurador Marco Delfino não veio porque o chefe dele não liberou (durante a oitiva o fato do MPF ter justificado a falta de recursos rendeu ironias por parte dos parlamentares) . A CPI tem que cumprir o papel dela de convidá-lo novamente. Eu entendo que ele como servidor federal tem prerrogativas. Aqui disseram que irão chamá-lo para depor coercitivamente e de camburão…Ele cumpre com a obrigação constitucional porque trabalha na defesa dos interesses dos índios! Agora quando tentam minimizar dizendo que aqui (MS) não há assassinatos de índios (genocídio) e sim, índios que se matam entre sim é para minimizar o tamanho do problema! Simião Vilhalva não foi atropelado, foi morto com um bala na cabeça! Oziel! Xuriti! Marçal de Souza, que até hoje não teve a morte esclarecida! O Oziel morreu em Buriti numa ação desastrosa da Polícia Federal! Neste Estado não existe interesse em investigar as mortes de índios”, finalizou quando interrompido pelo fato de criticar operação da PF que resultou na morte do agente de saúde Oziel, em Sidrolândia. “Oziel foi morto! Eu fui ao velório dele. Tiveram que retirar o corpo de lá porque queriam enterrar sem perícia”.