Junho Prata: Seminário destaca importância da prevenção à violência

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Seminário faz parte das ações da campanha "Junho Prata", instituída há um ano
27/06/2019 - 18:30 Por: Osvaldo Júnior   Foto: Wagner Guimarães

Um consenso permeou as falas dos participantes do 4º Seminário Estadual de Enfrentamento à Violência contra a Pessoa Idosa, realizado na tarde desta quinta-feira (27), na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul: a melhor forma de combater a violência é evitar que ela aconteça. Essa compreensão reforça a importância do “Junho Prata”, que visa sensibilizar as pessoas quanto a violações de direitos dos idosos. O evento de hoje, proposto pelo deputado Renato Câmara (MDB), coordenador da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, marca o primeiro ano da campanha, instituída pela Lei Estadual 5.215, de 15 de junho de 2018.


Deputado Renato Câmara é o propositor do evento

Por cerca de quatro horas, o Plenário Deputado Júlio Maia, que ficou lotado, foi espaço para reflexão e debate sobre as várias faces da violência contra os idosos. O assunto foi aprofundado e problematizado por palestras proferidas pelo assistente social Valdereis Freitas de Souza, coordenador de Proteção Social Básica da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Assistência Social e Trabalho (Sedhast), pela promotora de Justiça Cristiane Barreto Nogueira Rizkallah, titular da 44ª Promotoria do Idoso de Campo Grande, e por Maria Lúcia Secoti Filizola, presidente do Conselho Nacional dos Direitos do Idoso (CNDI). 

“A violência doméstica contra a pessoa idosa, que é o tema deste seminário, é um problema muito delicado, difícil de ser tratado, mas que deve ser discutido. É um tema difícil, porque estamos falando de violência praticada por agressor próximo do idoso, um parente ou outra pessoa que convive com ele”, pontuou Renato Câmara.

As várias faces da violência


O assistente social Valdereis falou sobre os vários tipos de violência

Formas diversas de manifestação da violência contra a pessoa idosa foram analisadas por Valdereis de Souza, durante a palestra “Violência familiar e social”. O assistente social elencou diferentes tipos de violência contra os idosos: abuso físico (empurrar, balançar, bater, sobremedicar a pessoa idosa), psicológica (infantilizar, ofender, pressionar), financeira (apropriar-se ilegalmente do dinheiro do idoso, vender seus bens, fazer empréstimos que o prejudica no pagamento de despesas essenciais), negligência (como negar alimentação adequada, atenção médica, casa, roupa, etc., à pessoa idosa) e institucional (ausência ou insuficiência de políticas públicas voltadas à promoção dos direitos dos idosos, não desenvolvimento de tecnologias inclusivas, entre outras).

Essas formas de violência, conforme Valdereis, são agravadas por fatores associados, como concentração de familiares no domicílio, conflitos de gerações e precariedades das condições socioeconômicas. “E, em quase todos os casos, os agressores, são, na maioria, pessoas próximas ao idoso”, acrescentou o assistente social. Dados citados por ele mostram que metade das práticas violentas é cometida pelos filhos, 17% por outras pessoas, 14% por familiares diversos, 11% por agressor não identificado e 8% pelo cônjuge.

Entre a dor da violência e a de denunciar alguém da família

E o que fazer quando o próprio idoso, que é vítima, não percebe a violência ou prefere não denunciar o agressor? Isso é algo muito comum de acordo com a promotora de Justiça Cristiane Rizkallah, que proferiu a palestra “Violência econômica (financeira e patrimonial)”. “Muitas vezes, o idoso sofre violência financeira e não tem consciência disso ou é conivente”, disse. Ela exemplificou diversas situações concernentes a esse tipo de violência: compras indevidas ou empréstimos em nome do idoso, apropriação do patrimônio da pessoa idosa, com uso ou não de procuração, com conhecimento ou não da vítima. “Isso é mais comum do que geralmente se imagina”, reforçou.


A promotora Cristiane Rizkallah explanou sobre a violência econômica

De acordo com a Cristiane Rizkallah, as práticas mais frequentes em sua promotoria são relativas aos artigos 102 e 104 do Estatuto do Idoso. O primeiro artigo estabelece como crime a apropriação ou desvio “de bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso”, e prevê como pena reclusão de um a quatro anos e multa. Já o crime referente ao artigo 104 é o de “reter o cartão magnético de conta bancária relativa a benefícios, proventos ou pensão do idoso, bem como qualquer outro documento com objetivo de assegurar recebimento ou ressarcimento de dívida”. Neste caso, o autor pode ficar até dois anos preso.

Ela mencionou, ainda, que outras ações criminosas comuns, tratadas na 44ª Promotoria, dizem respeito ao artigo 106 – “induzir pessoa idosa sem discernimento de seus atos a outorgar procuração para fins de administração de bens ou deles dispor livremente – e 107 – “coagir, de qualquer modo, o idoso a doar, contratar,  testar ou outorgar procuração”. No primeiro caso, a pena pode chegar a quatro anos de reclusão e, no segundo, é de até cinco anos.

O rigor da lei, no entanto, é ofuscado pelos laços de afetividade. “Infelizmente, a maioria desses processos criminais se encerra em absolvição. O idoso acaba negando tudo, com medo do filho ser preso”, constata a promotora. Por isso, acredita ela, que a prevenção é a melhor forma de combater a violência. “É preciso trabalho de conscientização constante, de educação das pessoas desde pequenas. A conscientização, sobretudo das crianças, é o que pode dar o melhor resultado”, defendeu. “O amor deve ser ensinado desde pequeno. E, quando necessário, deve-se punir, de forma educativa, todas as formas de desamor. Só assim teremos seres humanos melhores, com consciência das consequências de suas ações”, completou.


Lúcia Secoti tratou sobre o papel do CNDI no enfrentamento à violência

Campanhas educativas, consciência dos direitos e cidadania

“Para ter os direitos respeitados é importante conhecê-los”, afirmou Maria Lúcia Secoti, que proferiu a palestra intitulada “O papel do Conselho Nacional dos Direitos do Idoso no enfrentamento à violência”. Ela enfatizou que os direitos são assegurados por leis, resultantes de conquistas. “Assim como as leis, envelhecer também é uma conquista”, acrescentou.

Lúcia Secoti apresentou e comentou deliberações de conferências do CNDI, entre as quais está a seguinte: “Realizar, fomentar e garantir diagnósticos das necessidades da pessoa idosa, na zona urbana e rural, traçando seu perfil socieconômico e da rede de serviços existente”. De acordo com a presidente do CNDI, só é possível definir políticas públicas se houver diagnóticos, se a realidade for conhecida.

Outra deliberação, entre as mencionadas por Lúcia Secoti, é esta: “Promover amplas e contínuas campanhas educativas sobre a violência contra a pessoa idosa, em todas as esferas de governo, incluindo a questão da segregação, infantilização e estigmatização”. “Neste ponto, quero destacar a campanha ‘Junho Prata’, instituída pela Lei 5.215, que completa um ano”, disse.

A presidente do CNDI reforçou a importância da prevenção, através de campanhas educativas. “É preciso educar toda a sociedade. E qual deve ser a grande conscientização? A de derrubar o preconceito de que não há futuro para o idoso”, considerou. Essa consciência decorre, segundo Lúcia Secoti, do conhecimento dos direitos, o que permite o exercício efetivo da cidadania. “O maior antídoto para a violência é a ampliação da inclusão na cidadania”, finalizou, citando frase da socióloga Maria Cecília Minayo.

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