Psiquiatria da Santa Casa: Médicos pedem apoio e Defensoria cogita ação coletiva

Imagem: Martinez e Dr. Paulo Siufi: mobilização de médicos ganha adesão de deputados
Martinez e Dr. Paulo Siufi: mobilização de médicos ganha adesão de deputados
06/09/2017 - 13:22 Por: Fabiana Silvestre    Foto: Victor Chileno

Médicos, representantes de entidades ligadas à saúde e profissionais que trabalham na Associação Beneficente de Campo Grande - Santa Casa - participaram da sessão plenária desta quarta-feira (6/9) e pediram apoio dos deputados estaduais para impedir o fechamento da psiquiatria do hospital. O psiquiatra Bervely Martinez considerou a situação "gravíssima" e lembrou que a extinção das vagas comprometerá o atendimento ambulatorial e aos pacientes internados. Segundo ele, nove residentes, nove médicos, um estágiário e 13 técnicos trabalham no setor, que tem 10 leitos.

"A disponibilidade do leito junto a um hospital geral é o que temos de mais moderno em atendimento psiquiátrico e todos sabem disso. Transferir os dez leitos para o Nosso Lar, como alguns dizem que pode acontecer, seria um retrocesso enorme, com todo o respeito ao trabalho realizado lá", analisou Martinez. Ele informou que os profissionais apresentaram propostas à direção da Santa Casa para reduzir custos, considerando que uma das alegações dos gestores é a de que o setor seria "caro demais".

"Eles estimam receita de R$ 19 mil mensais, de recursos unicamente do SUS [Sistema Único de Saúde], quando sabemos que ainda há as pactuações com Estado e Prefeitura, mas dizem que gastamos R$ 440 mil. Há um contrassenso nisso, porque na planilha apresentada constam que utilizamos R$ 5 mil em medicamentos e R$ 40 mil em limpeza, o que é impossível. Falta proporcionalidade nos cálculos", explicou, lembrando que o déficit do hospital é de R$ 3,8 milhões mensais. Atualmente, quem não tem plano de saúde pode recorrer, em Campo Grande, à Santa Casa, Hospital Regional de Mato Grosso do Sul e Hospital Nosso Lar, que totalizam aproxidamente 100 leitos, número absurdamente abaixo da meta preconizada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), de um leito para cada mil habitantes.

A situação também preocupa a Defensoria Pública Estadual, que cogita ajuizar ação coletiva para garantir a manutenção dos atendimentos na psiquiatria, segundo informou a  coordenadora do Núcleo de Ações Institucionais do órgão, Eni Diniz. Ela explicou que pelo menos 300 adultos, 42 adolescentes e 60 crianças serão diretamente prejudicados com o fechamento da ala e terão que voltar para a regulação do SUS, onde seis mil aguardam atendimento psiquiátrico. "Somos veementemente contra o fechamento e vamos acompanhar os encaminhamentos, mas já analisamos acionar todos os responsáveis para não permitir que o atendimento seja interrompido", disse. Para ela, caso se confirme a extinção do setor, haverá "repercussão de devastadora proporções".

Eni lembrou que os pacientes teriam os tratamentos interrompidos e a cidade viveria um "retrocesso sem tamanho". "Estamos indo na contramão do que é referência em atendimento em saúde mental, enquanto o Ministério da Saúde aumenta os leitos em 36% [entre 2014 e 2017]", contou. Dados da OMS revelam que pelo menos 26 milhões de brasileiros sofrem de algum tipo de distúrbio ou doença mental, sendo que cinco milhões deles são considerados pacientes moderados ou graves. A defensora alertou ainda para outra consequência do fechamento dos leitos: a judicialização. "Já temos milhares de ações de pessoas que precisam de medicamentos, de leitos em UTIs e certamente teremos muito mais porque o atendimento é necessário. Esperamos, de coração, que essa situação se resolva da melhor forma".

#SomosTodosPsiquiatria

Presidente da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa, Dr. Paulo Siufi (PMDB) demonstrou indignação com relação ao fechamento da ala psiquiátrica e lamentou as mudanças administrativas anunciadas pelos gestores do hospital. "Já não basta todo o estigma e preconceito que os doentes mentais sofrem, desde o tempo dos antigos manicômios. Agora, querem mexer em um setor que funciona muito bem e que atende as pessoas mais carentes. De beneficente, a Santa Casa passou à instituição que visa o lucro. Mas não vamos deixar fechar a psiquiatria", garantiu, ressaltando que formalizará denúncia junto ao Ministério Público Estadual (MPE).

Entre os argumentos favoráveis à manutenção da ala especializada no hospital, Siufi lembrou que a atitude extrema de tirar a própria vida está no fim da linha de quem, muitas vezes, tem algum distúrbio ou doença mental e que precisa de cuidados constantes. "Campo Grande está entre as capitais com mais suicídios no Brasil, especialmente entre a população jovem, e o que vai acontecer se não houver leitos? E as pessoas que se mutilam e que têm outras doenças mentais?", questionou. O deputado também se ofereceu para destinar emendas parlamentares à manutenção das atividades no setor.

Líder do Governo do Estado na Casa de Leis, Professor Rinaldo (PSDB) disse que estão em dia os repasses dos cofres estaduais ao hospital. "O que nos cabe [Governo do Estado], que são recursos da ordem de R$ 2,5 milhões, está sendo cumprido e estamos solidários à luta dos profissionais da saúde", afirmou. Lidio Lopes (PEN), Renato Câmara (PMDB) e Felipe Orro (PSDB) também manifestaram apoio à manutenção dos atendimentos prestados à população e à mobilização dos médicos e demais profissionais da psiquiatria.

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