Setembro Amarelo: Audiência alerta para sinais suicidas e como ajudar

Imagem: Os homens representam 79% do total de pessoas que se suicidam no Brasil
Os homens representam 79% do total de pessoas que se suicidam no Brasil
02/09/2019 - 12:28 Por: Fernanda Kintschner   Foto: Luciana Nassar

Ouvir, não julgar e acolher são algumas das ações para prevenção ao suicídio, tema debatido em audiência pública realizada na manhã desta segunda-feira (2) na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (ALMS), por proposição do deputado Herculano Borges (Solidariedade).

O evento, realizado no Plenário Júlio Maia, contou com duas palestras, a do professor Edilson Reis, que atua como capelão no Hospital Universitário da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e a do médico psiquiatra Marcos Estevão. Capelão Reis trouxe dados alarmantes sobre os índices de quem atenta contra sua própria vida. Os homens são os que mais se suicidam, com 79% dos casos no Brasil. Já as mulheres são as que mais tentam suicídio, com 69% do índice das tentativas.


Capelão Reis explicou que falar é terapêutico

Os dados são do Ministério da Saúde, que ainda demonstra que Mato Grosso do Sul é o 3º estado no Brasil com maior taxa de suicídio. “Por dia são de 40 a 50 pessoas que se matam no Brasil. É um suicídio a cada 40 segundos no mundo, sendo uma tentativa a cada três segundos. É a segunda maior causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos de idade”, alertou Capelão Reis. O estudioso disse que o índice também é crescente entre os idosos, devido à solidão e negligência e nas populações indígenas, muitas vezes desassistidas.

Sinais

Ambos os palestrantes ensinaram a detectar os sinais de alguém que está sofrendo e pensando em tirar a própria vida. “Pergunte onde doi? Como posso te ajudar? Se o sujeito é ouvido ele será acolhido. A palavra é a morte do nó do sofrimento. Precisamos falar para entender a dor e tratar a depressão”, disse Reis.


O psiquiatra Marcos Estevão falou dos três D e dos três I a identificarmos

O psiquiatra Marcos Estevão sistematizou os três D e os três I para serem identificados:

Desamparo, desesperança e desespero  – “Frases como ‘eu sou um estorvo, eu dou trabalho, queria que Deus me levasse, estou pensando em me matar’, leve a pessoa a um profissional. Ela quer compartilhar a dor, mas talvez não encontrou a pessoa certa”, disse.

Intolerável, inescapável e interminável – “Frases que demonstrem que a pessoa se sente ‘sem saída’, que a dor só acabará com a morte, também são sinais, pois o suicídio vem com um conjunto de fatores familiares, sociais, biológicos, com a morte como fuga do sofrimento”, explicou Marcos Estevão.

 O que fazer?

Os palestrantes reforçam que é preciso ouvir sem julgamentos e procurar ajuda especializada. Eles exemplificaram que audiências públicas como a de hoje, escolas abertas ao diálogo, igrejas em apoio e a imprensa divulgando o assunto ainda tabu fazem parte do “trabalho formiguinha” que ajuda a lidar com o tema.


O suicídio é a segunda maior causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos

“Precisamos descontruir o termo ‘família desestruturada’. Toda família tem problema. O que existem são famílias com quadros de doenças, que podem ser tratadas e que, às vezes, se é o único apoio que tem. Precisamos do trabalho de posvenção, que é o acolhimento de quem ficou, quando há um suicídio na família, no serviço ou na escola. Ninguém sai ileso. Há sentimentos de culpa, de isolamento. Infelizmente não temos onde internar. Salvamos pessoas que estão tentando, mas não tem aonde levar. Precisamos mudar protocolos de atendimento e o preconceito de que quem toma remédio é louco. É preciso procurar ajuda sim”, disse Capelão Reis.

O médico concordou. “Hoje liberam pacientes que tentaram suicídio. Ele vai morrer. Se alguém quase enfartando vai à unidade de saúde e é liberado ele morre. Com a Lei Antimanicomial [10.216/2001perdemos 90 mil leitos hospitalares, dos 120 mil leitos que a psiquiatria tinha no país. Em Campo Grande, temos só 30 leitos no Hospital Nosso Lar e oito para dependentes químicos no Hospital Regional. Precisamos de mais, pois os Centros Psicossociais que dão o atendimento inicial não dão a terapia intensiva necessária”, ressaltou Marcos Estevão.

Religiões também contribuem


As mulheres são as que mais tentam suicídio

Representando os católicos, o arcebispo de Campo Grande, Dom Dimas, falou que as igrejas têm implementado o Ministério da Escuta, para identificar e acolher quem está precisando ser ouvido sem julgamento. “Sentimos que hoje há uma autocobrança muito grande, em que não se permitem fracassos ou se sentir vulnerável. Temos padres prontos para confissão e fazemos encaminhamento profissional, além do pronto socorro espiritual”, ressaltou.

Em nome dos evangélicos, o representante do Conselho de Pastores, Silvio Sandim, disse que os templos também estão abertos além do culto. “Entendemos que a religião também pode salvar, pois ela prega o amor e os suicidas têm feridas profundas, por vezes não se sentem amados. Uma vez um tio me deu todos os sinais e não me atentei. Ele se suicidou e me senti péssimo por muito tempo. A religião está para ajudar a todos. É preciso pedir ajuda”, afirmou.

Darlene Cavalcante discursou em nome da Federação Espírita de Mato Grosso do Sul e relembrou que, desde 1993, há uma ação mundial em defesa da vida. “Muitas vezes, as pessoas sofrem caladas e a assistência espiritual está em todas as casas espíritas, que têm autonomia para lidar com ações individuais ou conjuntas. Nosso trabalho é amplo na posvenção para as famílias”, ressaltou.

Ações

Herculano Borges listou ações para serem implementadas ou sugeridas aos poderes públicos e sociedade civil para a prevenção do suicídio como resultado a audiência pública. Confira todas elas clicando aqui.


Herculano Borges leu oito encaminhamentos resultantes da audiência

“É um tema tão importante e tão atual. Queremos que essa discussão não se limite ao mês do setembro. Quem está em desequilíbrio não vai conseguir criar harmonia em casa, não vai render no trabalho, gera problema de saúde, gastos do poder público, afastamentos, enfim, é toda uma cadeia afetada e por isso é importante discutir e trazer ao debate, reconhecendo que ações de prevenção é questão de saúde pública e demandam políticas públicas específicas”, ponderou o deputado.

Em nome do poder público, o secretário de Saúde, Geraldo Resende, disse que os altos índices de suicídio são preocupantes. “Estamos trabalhando para criar condições para melhorar o acesso e o tratamento. Estamos com um olhar cuidadoso aos indígenas que estão com os números crescentes e buscamos esforços conjuntos. Esse é nosso compromisso para melhorar os números que hoje nos envergonham”.

Também participaram da audiência o deputado Professor Rinaldo (PSDB), a secretária especial de Cidadania do Estado, Luciana Azambuja, e representantes de diversas categorias, como os policiais militares e enfermeiros, além do Grupo Amor à Vida (GAV), que concede apoio emocional a quem busca ajuda. Reveja todas as falas na íntegra assistindo a audiência no YouTube da  Casa de Leis clicando aqui.

Busque ajuda

Se você precisa de ajuda, busque o GAV pelos telefones em Mato Grosso do Sul (67) 3383-4112, (67) 99266-6560 (Claro), (67) 99644-4141 (Vivo) e ainda site Grupoamorvida.ong. Também há o Centro de Valorização da Vida (CVV), que atende pelo telefone 188, email ou chat pelo site www.cvv.org.br. Ambos garantem anonimato e total sigilo.

O Setembro Amarelo é uma campanha nacional. Saiba mais em www.setembroamarelo.org.br. Compartilhe sua dor. 

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Crédito obrigatório para as fotografias, no formato Nome do fotógrafo/ALEMS.